21/09/06

recreio



nesse dia faltaram às aulas. a hora do recreio prolongou-se. chamando-os para um outro lugar. onde aprender. fosse uma brincadeira. sem manual obrigatório. sem matéria decorada. só corpo. e mente. com vontade desenfreada. de ajardinarem a fantasia. o resto do tempo. assim foi. ao volante de uma furgoneta. curva. contracurva. e zás. assaltaram uma loja de brinquedos. já em casa. procederam ao despejo do caruncho. tudo o que cheirava a rotina: cama. sofá. guarda-roupa. o espelho do disfarce. o lavatório das remelas. e foi nascendo. como quem encaixa legos. foi nascendo. digo. um jardim de infância. ela vinha de soquetes de rede. chamou-o: anda. vamos brincar. ele. de chinelos de sizal. deslizou até se afundar. no puf. quando se constrói uma casa. nunca se começa pelo telhado. concluíram. em uníssono. preambularam pelos calcanhares. o que antes era superficie lunar. terra ressequida. tornou-se. rápidamente. numa planta rara. muito verde. regada de saliva. subiram até aos joelhos. ainda com sinais. pústulas do sexo apressado. ali se demoraram. lábios em passeio circular. até ao desejado amolecimento. descansaram os dedos. prosseguiram a viagem. a brincadeira. fugindo às rotas de catálogo. contornaram os seios. detiveram-se nos pulsos. como adornar um pulso nú. sem o macular de lantejoulas? perguntou ela. e sem delongas. lavraram longos beijos. da polpa. aos pulsos. até que sentiram nascer. nos punhos de ambos. loiras argolas. eriçadas. evitaram o beijo convencional. a caricía premeditada. a posição explorada. em revistas e videos. olharam-se. simplesmente. a ternura infiltrou-se. no sangue. sonegando o instinto. nenhum dedo enclavinhado. as mãos estavam destinadas. para os cabelos. entrançaram-se. tecendo um baloiço de madeixas. nisto. tocou. iam ter matemática. ficaram-se. na longa equação do recreio.


*

(quadro de júlio pomar)

4 comentários:

Anónimo disse...

se eu soubesse dizer coisas de jeito diria, deste teu texto, que "a língua que eu quero é essa que perde função e se torna carícia". Gostei!

Anónimo disse...

Carinho...claro que, troco o manual obligatório da sociedade e a lógica matemática por:

- a malícia de um olhar
- o saber de um beijo
- a simplicidade dos pulsos
- a sensualidade dos seios
- a ternura de uma carícia
- momentos partilhados
- a complicidade eterna...

adorei o texto... obgd bjs

Anónimo disse...

Isto sim... é só para ti meu Amor.
Adorei o texto é lindo de morrer, é o reflexo do que somos, do que gostamos e das nossas carícias.
Obgd por essa carta tao linda com ela viajei até á ternura da infancia. onde tudo é novo sem regras nem manuais. onde o Amor é sincero. e a complicidade é mútua. e é onde as coisas mais simples sao as que importam, como a delicadeza de um pulso. Te adoro. Beijinho.

Anónimo disse...

Sabes que? tenho que actualizar a matemática...

carícias multiplicada por ternura dividida entre dois igual Amor vírgula complicidade... esquecemos a lógica?...


bjs