12/10/06

poemúsica




deste-me um telão. e o cheiro da tinta. e eu escrevi em sangue. o que as palavras antigas. não conheciam. deste-me uma fuga de bach. as valquírias de wagner. para eu descer ao poço mais fundo da perda. deste-me cometas e estrelas matutinas. e eu conheci. finalmente. que as letras. juntas. aquecem. sonhos diurnos. numa voragem sideral. deste-me um corpo sem espartilhos. e eu saboreei. o gosto do naufrágio. deste-me a tua inocência. em troca de quase nada: um poema escrito a desoras. uma metáfora inventada no vazio nocturno da melancolia. deste-me pão quente. ervas. chã da índia. e scones. porque os meus punhos morriam de fome. na busca de uma paisagem. de um traço rendilhado na paleta de velhos alquimistas. deste-me. tudo. para que o fino carvão do lápis. não morresse de cansaço. agora ofereces-me a ausência. apagas a memória. desistes da viagem matinal. com que colorias o meu primeiro esboço de palavra. tens razão. talvez não mereça outra coisa. uma folha branca. a chorar.

(VERSÃO ORIGINAL
ESCRITA 15/3/2005)


*

(fotografia de augusto peixoto)

1 comentário:

Anónimo disse...

Não acredito. Cheguei no fim.

Bem ainda são os restos de 6ª feira 13...

:(